Paralisia
A infectologista Luiza Helena Falleiros Arlant lembra que a infecção pelo poliovírus é muitas vezes assintomática, mas pode ser grave e provocar paralisias irreversíveis e fatais, já que, além dos membros, a pólio também pode paralisar os músculos responsáveis pela respiração. Nesses casos, a sobrevivência do paciente pode passar a depender do uso de um respirador.
"Só existe uma maneira de prevenir pólio, que é através da vacinação. Mas com uma vacinação muito baixa, tem mais gente suscetível. Se temos quase 3 milhões de crianças nascidas vivas por ano, e se temos uma vacinação de 60%, temos 40% de quase 3 milhões que não foram vacinadas", alerta a médica, que é presidente da Câmara Técnica de Pólio do Ministério da Saúde e membro da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
A infectologista destaca que as três doses da vacina intramuscular deixam as crianças protegidas contra os três sorotipos do poliovírus, enquanto as gotinhas imunizam apenas contra dois deles. Para os pais que perderam o momento dessa vacina ou atrasaram alguma das três doses, a especialista recomenda que retornem imediatamente aos postos para continuar o esquema vacinal de onde ele foi interrompido.
"Se uma criança tomou uma vacina e ficou três anos sem receber nenhuma outra dose, ela tem que receber a segunda dose e, dois meses depois, receber a terceira. Ninguém recomeça o esquema, tem que continuar de onde parou. E continuar com a vacina intramuscular", afirma a médica.
Mobilização
Luiza Helena Falleiros avalia que as causas para a queda das coberturas vacinais são multifatoriais. Elas envolvem desde o treinamento dos funcionários nas unidades básicas de saúde para não perder oportunidades de vacinar e falar sobre vacinação sempre que as famílias passam pelos postos até as condições de vida dos responsáveis pelas crianças que precisam ser vacinadas.
"Os postos têm que abrir, de preferência, de 7h às 19h, porque hoje você depende do trabalho como nunca e perder um dia de trabalho hoje é perder um prato de comida na mesa. Você não pode exigir que os trabalhadores deixem de ganhar dinheiro para sustentar uma família com o básico para ir ao posto de saúde. E ainda chegar lá e descobrir que a vacina acabou ou que a vacina não veio e ter que voltar no dia seguinte".
Pesquisador do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) desde a década de 1970, Akira Homma participou do trabalho de estruturar a produção das vacinas contra a poliomielite no Brasil, decisivo para que a doença fosse erradicada. Para ele, as coberturas vacinais atuais são muito preocupantes, mesmo em um país que é autossuficiente na produção da vacina intramuscular, numa parceria entre a Fiocruz e a farmacêutica Sanofi.
"Quando nós usamos a vacina de vírus atenuado para a eliminação da pólio na década de 1980, havia dias nacionais de vacinação que contavam com a participação de toda a sociedade brasileira e voluntários em milhares de postos de saúde, vacinando 18 milhões de crianças abaixo de 5 anos em dois ou três dias", lembra ele. "Não sei se conseguiríamos outra vez aquela mobilização, porque os momentos são diferentes, as prioridades são diferentes, mas a gente tem que buscar uma mensagem, porque a mensagem que está sendo transmitida não está chegando na população, não está tocando a população".
A própria erradicação da pólio, na opinião do cientista, fez com que a população perdesse o medo e o interesse pela doença, que já foi motivo de pavor de famílias ao redor do mundo ao longo do Século 20.
"A população hoje pensa que já está protegida, mas não está", diz ele, que defende que seja incluída mais uma dose da vacina inativada contra a poliomielite no calendário vacinal das crianças, e que seja feita uma investigação epidemiológica para saber como está a imunidade dos adultos que tomaram apenas a vacina oral.
Agência Brasil