A Polícia Civil do RJ e o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) prenderam nesta segunda-feira nove pessoas pelo envolvimento na morte do pastor Anderson do Carmo, executado com mais de 30 tiros em 16 de junho de 2019.
Segundo a força-tarefa da Operação Lucas 12, a viúva, a deputada federal Flordelis (PSD-RJ), é a mandante do crime. Ela não pôde ser presa por causa da imunidade parlamentar -- quando somente flagrantes de crimes inafiançáveis são passíveis de prisão.
Segundo a polícia, antes do assassinato a tiros, Flordelis começou a tentar matar o marido em maio de 2018, botando arsênico na comida dele.
As prisões foram expedidas pela 3ª Vara Criminal de Niterói, que aceitou a denúncia do MP e tornou Flordelis ré.
Filhos de Flordelis são presos por suspeita no envolvimento na morte do pastor Anderson do Carmo — Foto: Reprodução / TV Globo
Com a Lucas 12, chega a sete o número de filhos presos no caso. Todos já são réus perante a Justiça.
A defesa de Flordelis se disse "surpresa com a prisão". "A deputada está muito aborrecida e chateada com tudo que está ocorrendo porque tem com ela a inocência", disse o advogado Anderson Rollemberg (leia mais abaixo).
O PSD divulgou nota em que anunciou "a suspensão imediata da filiação" da deputada (leia abaixo).
Segundo determinação da juíza Nearis dos Santos Carvalho Arce, a deputada não pode se ausentar do país sem autorização judicial ou transferir sua residência para outra cidade. Ainda segundo a magistrada, Flordelis está proibida de manter contato com qualquer testemunha ou com os outros réus.
“Afastada a possibilidade do decreto prisional por força da imunidade constitucional, resta a possibilidade de decretação de medidas cautelares diversas da prisão, que igualmente visam a resguardar a ordem pública e garantir a conveniência à instrução criminal, de forma a garantir a regularidade do processo”, diz a decisão.
Os policiais saíram para cumprir 17 mandados de busca e apreensão nas cidades do Rio de Janeiro, Niterói e São Gonçalo.
Um dos endereços foi a casa da deputada, local do crime, no bairro de Pendotiba, em Niterói, na Região Metropolitana do RJ, onde quatro filhos foram presos.
O apartamento funcional da deputada, em Brasília, também foi alvo de buscas. Lá, foi presa a neta Rayane. Pouco antes das 7h, policiais civis do Distrito Federal deixaram o imóvel carregando malotes.
Policiais chegam para cumprir mandado na casa onde o pastor Anderson foi morto — Foto: Reprodução/TV Globo
O delegado Allan Duarte, da Delegacia de Homicídios de Niterói, afirmou que Flordelis construiu um "enredo" para chegar à Câmara e construir sua igreja.
"A investigação demostrou que toda aquela imagem altruísta e de decência era apenas um enredo para alcançar a posição financeira e política. Depois que ela alcançou esse objetivo principal de chegar à Câmara dos Deputados, ela colocou em prática esse plano criminoso intrafamiliar", disse.
Allan explicou que "a principal motivação foi financeira". "A gente percebeu que foram realizadas diversas tentativas de envenenamento com doses letais, e esse resultado não aconteceu antes por motivos alheios à vontade dos autores", afirmou.
Já o delegado Antônio Ricardo Nunes, diretor do Departamento-Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa, destacou que um quinto da família se envolveu na execução.
“Temos aí 11 pessoas respondendo criminalmente, levando em conta que a família são 55, nós temos 20% da família envolvida nesse crime”, afirmou o delegado.
A polícia assim dividiu a participação na morte de Anderson.
Presos na casa de Pendotiba (Niterói), local do crime:
Preso em Camboinhas (Niterói):
Presa em Guaratiba (Zona Oeste do Rio):
Presa em Brasília:
Já estavam presos:
Além desses nove, foram denunciados:
"Lucas 12" se refere a uma passagem bíblica. No livro, o apóstolo lembra uma fala de Jesus a uma multidão.
“Tenham cuidado com o fermento dos fariseus, que é a hipocrisia. Não há nada escondido que não venha a ser descoberto, ou oculto que não venha a ser conhecido”, disse Jesus.
“O que vocês disseram nas trevas será ouvido à luz do dia, e o que vocês sussurraram aos ouvidos dentro de casa, será proclamado dos telhados”, emendou.
“Alguém da multidão lhe disse: ‘Mestre, dize a meu irmão que divida a herança comigo’. Respondeu Jesus: ‘Homem, quem me designou juiz ou árbitro entre vocês?’”
“Então lhes disse: ‘Cuidado! Fiquem de sobreaviso contra todo tipo de ganância; a vida de um homem não consiste na quantidade dos seus bens.’”
A jornalistas na delegacia, o advogado Anderson Rollemberg disse ter ficado surpreso.
“A defesa foi surpreendida com essas prisões preventivas das cinco filhas da deputada e da neta. Tomaremos conhecimento do que há de indícios para que essas prisões fossem feitas e para o indiciamento da deputada, já que na primeira fase da investigação, passou longe de qualquer prova que a apontasse como mandante", afirmou.
"A deputada está muito aborrecida e chateada com tudo que está ocorrendo porque tem com ela a inocência. Jamais foi mandante desse crime bárbaro", destacou.
Segundo o advogado, Flordelis não tinha ingerência sobre o dinheiro da família. "Ela é cantora gospel, líder religiosa e parlamentar federal. A questão dela sempre foi dar o melhor para os necessitados. Por isso tinha mais de 50 filhos. Na opinião da defesa, está havendo um grande equívoco no desfecho desta investigação”.
Uma nota assinada por Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD, anunciou a suspensão da filiação e prevê a expulsão de Flordelis.
O PSD esclarece que desde o início acompanhou o caso citado e defendeu o andamento e aprofundamentos das investigações.
Diante do indiciamento da parlamentar, o corpo jurídico do partido adotará as medidas para a suspensão imediata de sua filiação e, a partir dos desdobramentos perante a Justiça, serão adotadas as medidas estatutárias para a expulsão da parlamentar dos seus quadros.
O crime ocorreu na noite de 16 de junho de 2019. Anderson do Carmo foi morto, com mais de 30 tiros, na garagem da casa onde morava com a família, em Pendotiba, Niterói.
Para a polícia, ficou evidenciada a intenção de matá-lo, sem que Anderson tivesse a chance de reagir.
Em junho deste ano, o G1 mostrou que, segundo a perícia, o pastor levou mais dois tiros após cair baleado no chão — um na lombar e outro no ouvido direito. A informação está no laudo da reconstituição do caso.
Flávio dos Santos, filho biológico de Flordelis, é apontado como autor dos disparos que mataram o pastor. Ele foi preso no velório do padrasto.
Já Lucas dos Santos de Souza, preso horas depois do irmão, é acusado de ter conseguido a arma do crime.
A pistola foi encontrada na casa da deputada. O telefone celular do pastor nunca apareceu.
Flávio e Lucas foram denunciados por homicídio triplamente qualificado (por motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa da vítima), com pena prevista de 12 a 30 anos.
Deputada Flordelis participa do velório do marido — Foto: Reprodução/TV Globo
Na investigação sobre por que Anderson foi morto, a polícia encontrou divergências nas versões e inconsistências nos depoimentos da família.
Os investigadores já sabiam que, além de diversas igrejas espalhadas pela Região Metropolitana, a família da deputada Flordelis e do pastor Anderson também tinha uma grande influência política na área.
Já se discutia, por exemplo, indicar uma pessoa de confiança a prefeito de São Gonçalo nas eleições deste ano.
Em novembro, o MPRJ apontou que Flordelis era suspeita de fraudar uma carta em que um de seus filhos confessou ter matado Anderson a mando de um dos irmãos.
A parlamentar, em entrevista, explicou que recebeu a carta das mãos da mulher de um preso. Na correspondência, ainda de acordo com o advogado de Flordelis, Lucas teria revelado que Mizael oferecera a ele um emprego e um carro em troca de um “susto”.
“Estão tentando jogar sobre mim uma culpa de um assassinato que não é verdade, que não fui eu, é uma farsa, e vai aparecer o verdadeiro mandante”, declarou Mizael.
Por Bette Lucchese, Felipe Freire e Marco Antônio Martins, Bom Dia Rio
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